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Más condições de trabalho e carreiras estagnadas levam médicos a abandonar o SNS

As más condições de trabalho e a falta de perspetivas de progressão na carreira estão a levar os médicos a sair do Serviço Nacional de Saúde (SNS). É o que revela o estudo «A carreira médica e os fatores determinantes da saída do SNS», o primeiro grande estudo sobre este fenómeno a ter lugar no país. Foi realizado pelo Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto em colaboração com a Secção Regional Norte da Ordem dos Médicos (OM) e incidiu apenas sobre médicos inscritos na Região Norte, mas será alargado ao resto do país.

Os resultados do estudo mostram que é transversal a insatisfação com as condições de trabalho no SNS, independentemente da faixa etária e da condição profissional dos inquiridos. As longas jornadas de trabalho são uma das principais razões, apontada por cerca de dois terços dos inquiridos. Um número que aumenta para 74% quando está em causa o pouco tempo disponível para família, amigos e lazer. Um quarto dos médicos reportou excesso de horas de trabalho todos os dias, situação muitas vezes agravada pelo desrespeito dos períodos de descanso compensatório (47%). Em entrevista, Miguel Guimarães, bastonário da Ordem dos Médicos, confirma que os médicos estão submetidos a grande pressão «para que façam mais horas extraordinárias e mais urgências».

Outra das principais razões que leva os médicos a abandonar o SNS é a falta de perspetivas de progressão na carreira. Mesmo fora das épocas de crise económica e financeira, em que as carreiras são congeladas a nível nacional, os concursos são uma raridade e arrastam-se penosamente. Mas pior do que isso é negar a oportunidade de uma carreira, como aconteceu com os médicos que não tiveram vaga no acesso ao internato da especialidade em 2015, uma realidade que ameaça tornar-se um problema recorrente nos próximos anos.

Quanto a remunerações, quase metade dos médicos inquiridos aufere um vencimento bruto mensal inferior a 3000 euros. O estudo não incluiu os rendimentos provenientes das horas extraordinárias, que são um complemento muito significativo, ainda que à custa de um elevado acréscimo de horas de trabalho e em períodos incómodos (noites, fins-de-semana e feriados). Por outro lado, no estudo do vencimento só foram incluídos médicos especialistas, ou seja, foi eliminado o viés dos salários mais baixos de quem está em início de carreira.

Para onde vão então os médicos que abandonam o SNS? A maior parte (43%) reformou-se, um terço trocou o público pelo setor privado e 7% emigrou. É entre os médicos mais novos que o futuro se revela menos animador: quatro em cada dez internos admite a possibilidade de deixar o SNS quando acabar a especialidade e quase metade (48%) considera emigrar. De facto, segundo os registos da OM, entre 2014 e 2016 emigraram 1225 médicos portugueses, por razões que se prendem com procura de melhores condições de trabalho e de remuneração. A autora do estudo, Marianela Ferreira, investigadora do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, afirma: «Não tem havido incentivos para fixar os médicos, o SNS não tem sido competitivo».

Este é um duro retrato de anos de más políticas e de desinvestimento, que mostram a descapitalização do maior bem do SNS: os seus profissionais. Este estudo demonstra bem a urgência em valorizar as carreiras médicas, em promover a especialização e em dar aos profissionais de saúde condições de trabalho dignas. Só assim é possível manter um SNS de qualidade.

Referências: Público,TSF,ISPUP,OM

Texto de opinião de T.R. Publicado originalmente no blogue Espaço Liberdade.

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