A Comissão Nacional de Medicina Geral e Familiar (MGF) da Federação Nacional dos Médicos (FNAM) tomou conhecimento da criação de nove indicadores, que permitem avaliar as atividades especificas das Unidades de Saúde Familiar (USF) modelo B para o ano de 2022, por parte da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), através de um fórum online.
Os nove indicadores criados são:
- 434.01: Índice de acompanhamento adequado em Planeamento Familiar
- 441.01: Índice de acompanhamento adequado em Saúde Materna
- 442.01: Índice de acompanhamento adequado Saúde Infantil no 1.º ano de vida
- 443.01: Índice de acompanhamento adequado Saúde Infantil no 2.º ano de vida
- 444.01: Índice de acompanhamento adequado Diabetes Mellitus
- 445.01: Índice de acompanhamento adequado Hipertensão arterial
- 446.01: Número de UCs atividades especificas médicas 2022
- 447.01: Número de UCs atividades especificas enfermagem 2022
- 448.01: Número de UCs atividades especificas secretariado clínico 2022
A FNAM vem denunciar que esta proposta não foi operacionalizada junto da Comissão Técnica Nacional nem das estruturas sindicais envolvidas na discussão do trabalho médico na área da MGF.
Esta proposta apresenta uma importante alteração do paradigma de prestação de cuidados médicos, uma vez que se trata da implementação de regras com relevante impacto em termos organizativos.
Para além disso, estes indicadores estão intrinsecamente ligados à remuneração dos profissionais em USF modelo B, o que teria de implicar a negociação com as estruturas sindicais.
As dimensões incluídas na construção destes indicadores são tecnicamente discutíveis, devendo esta discussão ocorrer na Comissão Técnica Nacional.
Atendendo ao facto de se estar a fazer a revisão do regime jurídico das USF (Decreto-Lei n.º 73/2017) e, assim, ao regime remuneratório das USF, a reconfiguração daquilo que é o núcleo da prestação de cuidados em MGF é necessária, devendo estar na agenda de todos os envolvidos.
A FNAM considera ser um mau princípio de atuação que a alteração às atividades específicas seja feita à revelia das equipas, privilegiando dimensões cujo controlo não depende das estruturas e dos profissionais de cuidados saúde primários.
A introdução da dimensão de resposta à doença aguda nas atividades específicas relativas aos grupos vulneráveis e de risco configura, por si, uma alteração do paradigma da prestação de cuidados de saúde primários e que, a ocorrer, tem de resultar de uma discussão ampla e alinhada com aquilo que é a Medicina Geral e Familiar.
É importante realçar que a acessibilidade não é um fim em si mesmo, não existindo acessibilidade absoluta e esta está condicionada por múltiplos fatores, muitos deles independentes da disponibilidade, organização, desempenho e oferta de cuidados pelos profissionais e pelas equipas.
O conceito de «consulta aberta» vai muito para além da resposta à doença aguda, sendo uma resposta a múltiplas situações que, do ponto de vista das pessoas, requerem consulta. Em MGF, «doença aguda» é um conceito redutor e seria importante perspetivar as USF como unidades prestadoras de cuidados de elevada complexidade, cujo objetivo único não é colmatar as falhas sentidas em outros níveis do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
A inclusão da Interrupção Voluntária da Gravidez nas atividades específicas em planeamento familiar é sinal de um retrocesso civilizacional e ideológico inaceitável, responsabilizando os profissionais de saúde familiar por uma decisão pessoal, que interessa apenas às mulheres, e traz uma dimensão de penalização às equipas decorrente da vivência individual de projetos reprodutivos, cujos determinantes vão muito para além da esfera de atuação das equipas de cuidados de saúde primários.
A alteração sugerida por estes novos indicadores poderá fazer sentido numa lógica de discussão e melhoria, mas nunca para aplicação retroativa, como expresso no Bilhete de Identidade dos mesmos, conhecida já no quarto mês de desempenho das unidades.
A FNAM vem demonstrar o seu profundo descontentamento com a forma como ficam arredados os profissionais da construção de cuidados de saúde primários robustos, mantendo-se a lógica de penalização das equipas e uma política errática quanto à definição do que se pretende dos cuidados de saúde primários.
O reforço do SNS e a retenção dos seus profissionais sai, mais uma vez, verdadeiramente abalada pela tutela.
A FNAM exige a discussão destas alterações propostas em sede de mesa negocial.
CN-MGF FNAM, aos 15/04/2022.