Vários médicos especialistas de ORL, uns ainda em funções, outro recentemente forçado a sair do SNS, com o apoio e patrocínio do Serviço Jurídico do Sindicato dos Médicos da Zona Sul (SMZS), deram entrada, junto do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa e do Tribunal do Trabalho de Lisboa, com ações individuais, por discriminação e assédio moral no local de trabalho, contra o CHULN, representado pelo seu cessante Conselho de Administração, e contra o Diretor do Serviço de ORL do Hospital de Santa Maria, ainda em funções.
Em causa estão matérias como violação dos horários individuais de trabalho aprovados e em vigor, planificação laboral conhecida praticamente de véspera, e discriminação no acesso ao Bloco Operatório, nas escalas para o Serviço de Urgência, no gozo de férias, nas idas a congressos, bem como na autorização para lecionar na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, em acumulação com o exercício das funções assistenciais.
Os autores das referidas ações judiciais, todos eles assistentes hospitalares graduados da carreira especial médica, são, no plano técnico-científico, dos elementos mais diferenciados do Serviço de ORL do Hospital de Santa Maria, e sentem que, para além de estarem a ser privados dos tempos semanais de Bloco Operatório a que têm direito, para tratamento dos seus doentes, estão a ser escalados para o Serviço de Urgência com tempos de intervalo que violam as normas de segurança clínica mínimas, para médicos e doentes, aprovadas pela Direção-Geral de Saúde e Ordem dos Médicos. Isto enquanto outros elementos do Serviço, menos diferenciados, gozam de mais tempos cirúrgicos e são autorizados a cumprir parte do seu horário fora do Hospital (Unidade de Saúde Local do Litoral Alentejano e Centro Hospitalar Universitário do Algarve), ao abrigo de protocolos celebrados, de modo não transparente, com o CHULN, e a coberto de regimes contratuais de duvidosa legalidade.
Relembra-se que o atual Diretor do Serviço de ORL do Hospital de Santa Maria, a exercer o cargo desde 1 de novembro de 2016, na sequência de nomeação proferida pelo Conselho de Administração cessante do CHULN, sob proposta da Diretora Clínica, ocupava, à data, o 9º (nono) lugar na hierarquia do Serviço em termos da carreira especial médica
O Nomeado, para além da sua proximidade com o ex-Ministro da Saúde e com o, agora cessante, Presidente do Conselho de Administração do CHULN, acumulava e continua a acumular funções consultivas num grupo privado de Saúde, facto que levou o SMZS a denunciar de imediato a nomeação como “política” e lesiva do interesse público.
O Nomeado, posteriormente:
a) Viu suspensa, pela Ordem dos Médicos, a capacidade formativa do Serviço que dirige, por ter sido provada a existência de “factos relevantes que põem em causa o regular funcionamento assistencial e formativo do Serviço”. Em consequência dessa decisão, não está presentemente autorizada a entrada de novos Internos no Serviço;
b) Viu ser reportado, à Ordem dos Médicos, o afastamento deliberado da vida clínica do Serviço dos médicos seniores que contestaram a nomeação, por via da sua discriminação no acesso ao Bloco Operatório. Daqui resultou não só a suspensão do programa de Implantes Cocleares do Hospital de Santa Maria (parado desde Janeiro 2017, com doentes em espera desde 2015), como a progressiva redução do grau de diferenciação técnica das cirurgias que se efetuam no Serviço que, presentemente, não está longe do nível de um hospital secundário;
c) Viu ser reportado à Ordem dos Médicos o facto de, em consequência do ambiente tóxico entre pares, terem já saído 8 médicos do Serviço no espaço de pouco mais de um ano, bem como o facto de nenhum dos Internos que, entretanto, concluiu a Especialidade, ter querido ficar no Hospital, e, ainda, o facto de um recente concurso para admissão de Especialista ter fechado sem a apresentação de uma única candidatura – situação absolutamente inédita no Hospital Santa Maria.
O Serviço, fortemente desprestigiado na comunidade médica, não tem já clínicos para assegurar escalas, o que levou o Nomeado a encetar diligências para que outros Serviços de ORL de Lisboa venham “ajudar” na Urgência do Hospital de Santa Maria.
Acresce o facto de, na sequência das audições da Ordem, que resultaram na suspensão da idoneidade formativa, o Nomeado ter apresentado queixa-crime, por difamação, contra cinco médicos seniores do Serviço, entretanto constituídos arguidos em regime de termo de identidade e residência.
O SMZS entende que não é mais possível aceitar que um Serviço Hospitalar Universitário continuar a trabalhar nos termos acima expostos e, por isso, apoia inequivocamente a luta dos Especialistas, seus Associados, que agora iniciaram a referida ação judicial, na defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.
Essa luta defende, simultaneamente, a Dignidade do Trabalho Médico, o Interesse Público, em nome dos doentes, e o verdadeiro SNS, expurgado dos interesses de privados.
E também traduz, no momento atual, a realidade do que se passa no Hospital de Santa Maria, representando a outra face da recente tomada de posição pública de Diretores de Serviço do Hospital, quase todos nomeados pelo Conselho de Administração cessante, de apoio à continuidade do mesmo, em oposição à recente decisão da Senhora Ministra da Saúde.
A Direcção do SMZS